quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Do you remember?

No seu restaurante-marisqueira, prestes a fechar, ele pediu uma imperial, deu dois grandes goles deixando-a pela metade. Entretanto entrou uma esbelta mulher e rapidamente se sentou ao balcão ao lado dele.
- Oi - disse ela.
- Oi! - exclamou surpreendido - Então tudo bem? Como me encontraste aqui neste antro?
- Sabia que estarias aqui. É o teu refúgio e essa é a tua companhia, além do mais, todos conhecem isto.
- De todos os restaurantes do mundo inteiro tinhas logo que entrar no meu. – lamentou ele acendendo um cigarro.
- Não sejas assim! Já te disse; todos conhecem o Porto-Novo.
- Então “Cinderella” que vieste cá fazer. - Perguntou dando mais um bafo no cigarro.
- Vim dizer que te amo.
- E dizes isso assim, descontraidamente, como se de algo simples se tratasse.
- E como querias que dissesse? Que chorasse baba e ranho.
- Não… isso não. Não faz o teu género - afirmou ele sorrindo dando mais um gole na cerveja.
- Pois tens razão. Tentei de facto dize-lo em modo de gracejo. Lembro-me bem, «Acho que estou a começar a gostar de ti» lembro-me bem. Mas tu, simplesmente não descodificaste a mensagem. É normal em ti… distraído como o vento, mas para mim é um deleito, adoro esse teu defeito.
- No entanto que viste cá fazer? Não é costume. - perguntou ele. Bebendo mais um pouco da cerveja.
- Sem dúvida. Vim ver como estavas, beber um martíni, ganhar inspiração…
- Para o próximo policial ou será romance desta vez?
- Não sei ainda. Por isso é que aqui estou.
- Pensei que era pra me ver? – reclamou ele
- Claro que é pra te ver, mas e que mal tem juntar o útil ao agradável.
- Olha! Lembras-te desta música? – perguntou ele desviando a conversa.
- Se me lembro! “Play it again Sam” - gracejou ela – são coisas que nunca se esquecem.
- Grande filme. Na altura ainda éramos só sorrisos. – Comentou fumando um cigarro a olhar para o nada.
- É verdade. Lembras-te quando demos as mãos, naquela parte em que Laszlo ordena: “Play the Marseillaise. Play it!”
- E quando nos beijámos?... quando a Ilsa disse: “Kiss-me, kiss-me as if it where the last time”. Como me lembro. Parece que foi ontem, e hoje aqui estamos. Disse ele apagando o cigarro.
Ambos acabaram as bebidas; ele deu o último trago na cerveja e ela o último trago no martíni. Pediram então uma garrafa de vinho tinto de uma carta alentejana de 98.
- Porque não bebes Charlie? Era o teu preferido…
- Nosso! - clamou ele interrompendo-a – e ainda é. Não há vinho como esse! Verte ai um copo para mim.
- És…
-…Fantástico! – interrompeu ele indiferente – Já sei, tas sempre a dizer isso.
- Pois! É verdade… mas ia no entanto acrescentar, one in a million.
- Ah! Não digas isso - disse ele intimidado - então Gabby como vai ser o teu novo romance?
- Olha! – Suspirando - não sei. Provavelmente um sujeito e uma donzela, encostados ao balcão de uma marisqueira prestes a fechar, a beber vinho e sem saberem o que dizer um ao outro.
- Parece-me ser agradável. Na verdade os melhores momentos são estes, em que se começa sozinho e acaba-se acompanhado. É os chamados momentos imprevisíveis. – disse acendendo mais um cigarro.
- Olha! estão a tocar o que tu gostas. - disse ela dando mais um trago no copo de vinho.
- Ainda te lembras quem é?
- Como havia de me esquecer. Cada vez que a Eunice canta, os teus olhos brilham. Brilham como outrora brilhavam comigo.
- Ainda brilham Gabby. – disse ele olhando para ela – Nunca duvides disso. És a única a quem eles brilham como o sol. Engraçado! – disse voltando-se novamente para o balcão - Quando somos pequenos fazem-nos acreditar que o amor é como as historias da Branca de Neve. Longe disso. Bem mais complicado. Abre mais uma Frank.
- Tem a certeza? Não devia beber tanto – aconselhou Frank.
- Não te preocupes Frank, sei tratar de mim. Abre a garrafa e deixa-te de alvitres.
- Ainda há tempo? - perguntou surpresa Gabby.
- Óh menina! – gracejou Frank abrindo a garrafa – há tempo há. Tempo é a única coisa que não se pode comprar aqui no Cais do Sodré. Não se preocupe, não sairei daqui tão cedo. Enquanto o patrão ficar, eu ficarei.
- Hey Charlie - perguntaste-me o que andava a escrever e respondi-te e tu, em que andas a trabalhar? Uma fantasia calculo?
- Claro! Já me conheces. Qualquer coisa, metendo um casal, um barman e uma garrafa de vinho. E claro, um toque de fantasia.
- Charlie hein! Always trying to save the world.
- Temos que acreditar em algo não é verdade.
- É verdade!, há que acreditar em algo.
- Olha!... lembrei-me de uma historia, mas que tu podias dar-lhe continuidade – disse bebendo mais um gole de vinho e acendendo um cigarro.
Gabby sem sequer pedir, tirou confiantemente um cigarro para si e acendeu-o dando dois bafos seguidos.
- Não pares! - disse
- Começa com um homem rico – prosseguiu Charlie - a contar como juntou a sua riqueza. O homem que o está a ouvir é um detective privado. O cliente diz que alguém o quer matar, e de facto assim o é, por um assassino profissional contratado pela mulher, só que ele entretanto simula uma explosão no barco e a esposa é apanhada. The – fucking - End.
- Fatela. Mas tenho uma boa para ti. Um menino aventureiro cujo nome não se sabe. É conhecido apenas por “Menino dos calções pretos”, ele é um semideus, o que lhe permite fazer inúmeras coisas. Nesta aventura ele é o único capaz de encontrar um pergaminho essencial á humanidade. Ele é o escolhido. Então que achas?
- Não me agrada. - disse rindo – Olha estão a tocar o que tu gostas.
- Ainda te lembras? – perguntou ela sorrindo.
- Como podia esquecer o Eddy, era o que estava sempre a tocar lá no Porto. Adoras o homem. Quem dera que me adorasses tanto como a ele.
- E adoro parvalhão. Se soubesses o quanto eu te adoro, quem me dera não te amar tanto!
- Porque? Sou assim tão mau?
- Não… és bem mais que isso. És especial. Ainda foste mencionar o Porto. O Porto!, que maravilha. Tivemos belos momentos lá.
- Sim! sempre teremos o Porto. Bebo a isso. "Here’s looking at you, kid". – disse erguendo o copo.
Ela então começou a cantarolar uma música enquanto brincava com o copo e chocalhava a bebida.
- Out on the corner with cast iron blood
10,000 or more with hearts on their own…
- …they say i might die i maybe cold
I may have no jesus I may have no soul
– prossegiu charlie.
- Malandro! – replicou ela matando o ultimo gole de vinho.
- Olha! Mudando de conversa tenho uma proposta simpática para ti. Se quiseres ouvir.
- Estou ansiosa continua. – afirmou Gabby
- Envolve um casal, um filme e uma garrafa de vinho. O que me dizes de nos pormos a andar daqui pra fora e irmos para casa ver um filme?
- Tipo Humphrey Bogart e Ingrid Bergman. Que dizes?
- Não percamos mais tempo! Baby! lets go home. Frank dá me mais uma pra levar.
- Mas eu estou um pouco torta.
- Não te preocupes. Olharei por ti. Sempre o fiz! – disse charlie colocando o seu casaco em Gabby.
- És…
- …fantastico. Já sei.
- Não! – disse ela – One in a million.
Ambos despediram-se rapidamente de Frank que deu uma garrafa a Charlie. Á saida, um avião passou por cima deles.
- Sabes “Cinderella”? Este cenário lembra-me algo - comentou Charlie a Gabby.
Então Gabby gracejou com um sorriso:
- "Louis, I think this is the beginning of a beautiful friendship".

The – fucking - End

Eddie

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